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Por mais que se conviva, imagina-se navegar por um fiorde, ou seja, que se desliza protegido dos ventos, na placidez do conhecido. E, de repente, lavas estão a escorrer sobre a cabeça do navegante, descolando-lhe a pele, expondo seus ossos, levando-o a enxergar o mundo através de um véu de fogo. E a sensação que se tem quando se conhece a pessoa e se depara com a obra de Yara de Moraes. Seus quadros traduzem a troca permanente desses externos, uma espécie de anaplastia, como se autor e obra fossem um só corpo. Disto resulta não haver espaço para o envelhecimento, mas a vibração perene dos que se renovam, subjugando-se apenas à poliarquia da vida e impedindo a ancilose do espirito. 

 

Toda a sua manifestação artística vem ancorada em profundidade. Os sentimentos, por vezes escamoteados pelas cores que se esboroam no infinito, ressurgem na convicção de formas inclementes talvez demais fortes; porém, jamais duras. A flexibilidade é a constante, a mensagem é a do amor que investiga, insta, instiga - cada quadro, um cardioscópio. É a expressão do que vem de dentro, da arte como entrega e porta voz da alma. 

 

O pincel não beija a tela. Há, da parte daquele tão-somente um correr de lábios que a sangra e ao mesmo tempo a incensa... devagar. É o ritual para o lançamento de um grito confidente, como se o salário da dor fosse conferível apenas àquele que semeia terreno devoluto; e torna cativo o donatário da beleza. Observa- se, então, que o concerto da vida o solo não desponta, incorpora-se ao fomento do sonho, no limbo do absurdo. 

 

Vê-se neste pouco mais de três anos, o jaspe que vem de se transformar em linguados múltiplos que espetam a imaginação, levando a questionamentos que se resolvem na claridade. A invasão da luz chega às raias do desnudamento e induz indagar se não é essa a luminosidade de Deus - que atrai o olhar para o horizonte e promove a drenagem de toda angustia; intocada e saudade. 

 

 

Adriana Paes Cruz

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